terça-feira, 13 de outubro de 2015

Uma violenta espontaneidade

Por Roberto Cruz.

Certo dia, um amigo, leigo em xadrez, assistindo a uma das partidas "amistosas" do nosso clube, ficou alarmado com as fortes pancadas que dávamos no relógio e no tabuleiro com todo o barulho que provocava. Por brincadeira, expliquei que era porque se tratava de jogo de "cabras machos" que imprimiam muita agressividade em suas jogadas para intimidar o oponente.

No dia seguinte, esclareci que aquilo só podia acontecer nas partidas de clube e que nos torneios oficiais da Confederação Brasileira de Xadrez (CBX), se a gente se comportasse daquela maneira, o árbitro iria em cima na hora e muito provavelmente seríamos todos expulsos da sala de jogos!

Por lá o que impera é o silêncio absoluto para não prejudicar a concentração dos outros enxadristas. Não se pode nem conversar baixo depois de uma movimentada partida e já me chamaram a atenção por isso num desses torneios. Nem alfinete caindo, os árbitros querem ouvir.

No xadrez de rua da minha cidade natal, há muitos anos atrás, o que prevalecia era a violenta espontaneidade. Na partida final do torneio, fiquei horrorizado. Os adversários falavam alto, vociferando, batiam as peças estrondosamente no tabuleiro, ameaçando derrubar todas as outras, e chegavam ao cúmulo de bater a peça e depois "aparafusá-la", girando-a com força na casa e afirmando em voz alta que o "inimigo" jamais conseguiria tirá-la dali!

Aquela final quase que descambou para o mano a mano no estilo boxe-xadrez (chessboxing), uma modalidade de enxadrismo no qual os enxadristas disputam seis rounds sobre o tabuleiro intercalados com cinco assaltos de boxe, trocando sopapos de todos os tipos!

Mas isso aconteceu em tempos antigos, pré-históricos. Hoje em dia, graças a Deus, por lá ocorrem os campeonatos organizados pela CBX de forma muito civilizada, no total silêncio e tranquilidade.

Nos torneios de alto nível, os grandes mestres apenas tocam levemente nas teclas dos relógios de xadrez e deslizam suavemente as peças pelo tabuleiro, fazendo uma pausa para anotar gentilmente os lances e apertam a mão do adversário ao final de cada partida. Tudo como manda o figurino. É bonito de se ver.

Porém, as coisas não podem acontecer exatamente dessa forma, se for um campeonato de xadrez rápido com enxadristas exasperados em apuro de tempo. Nesse caso o "pau pode quebrar", mesmo num torneio da CBX.

Para saber mais:


quinta-feira, 8 de outubro de 2015

À procura da obra-prima de Leonard Barden

Por Roberto Cruz.

Na minha juventude, pude ter em mãos um exemplar do "Como Jogar bem Xadrez", do autor inglês Leonard Barden. Era uma edição primorosa de capa dura, publicado pelo Círculo do Livro. O dono do livro, Lemos, pôde me emprestar por uma semana apenas.

Durante aqueles poucos dias, fiquei fascinado com aquela obra-prima de leitura agradável, didática e repleta de belas fotografias em preto e branco. O livro de Barden continha ainda um prefácio notável do grande mestre Viktor Korchnoi com valiosos conselhos para os jovens enxadristas.

O fato de não poder ficar com o livro me deixou desolado. Insisti com o Lemos para me vendesse o livro, mas ele não quis de forma nenhuma, pois era um de seus livros prediletos.

Tentei adquiri-lo de outras formas, procurando em livrarias, sebos e até por reembolso postal, uma prática corrente na época, quando você não encontrava um livro em sua cidade. Porém, nada deu resultado. Obtê-lo na editora era quase impossível, pois o Círculo do Livro tinha por filosofia de vendas não manter estoques: fazia uma pequena tiragem para os seus sócios que, depois de esgotada, raramente seria repetida.

Aquela situação me deixou um tanto quanto "traumatizado", se me permitem o exagero.

Pouco tempo depois, conseguir adquirir um outro livro de Barden, o "Xadrez: Jogue como um Mestre em quadrinhos", da Editora Ediouro, também muito interessante e divertido, todavia, nada que se comparasse à sua obra-prima.

Passaram-se trinta anos e eis que belo dia em fim encontro um exemplar do meu desejado livro disponível à venda! Estava lá no site da Estante Virtual, uma genial rede de sebos de todo o país, criada pelo empreendedor André Garcia.

Encomendei o livro imediatamente e ele chegou poucos dias depois, muito bem embalado e com aspecto de seminovo, apenas um pequeno defeito, quase imperceptível, na parte superior da lombada.

Como fiquei feliz e finalmente livre daquele "trauma" medonho da juventude.

O que era o Círculo do Livro?

Uma editora que vendia livros em primorosas edições por um sistema de clube, no qual um leitor era indicado por um sócio e passava a receber periodicamente a "Revista do Livro" com dezenas de títulos a serem escolhidos, vários com descontos e promoções. O sócio tinha o compromisso de comprar pelo menos um livro naquele período a ser entregue pelos correios em sua residência. Se não fizesse nenhuma escolha, o clube remetia o livro destaque da revista para o sócio. O Círculo se tornou muito popular naquela época e contribuiu para que muita gente passasse a comprar livros e ter paixão pela leitura.

O Círculo infelizmente encerrou as suas operações no ano de 2000 e deixou muita gente com saudades.

Interessante que o Círculo ainda existe até hoje em Portugal, e por lá se chama "Círculo de Leitores". E não precisa mais da indicação de um sócio, você mesmo pode se inscrever no site da editora.

Leitura recomendada:
  • Como Jogar bem Xadrez, de Leonardo Barden. Editora do Círculo.
  • Xadrez: Jogue como um Mestre em quadrinhos, de Leonardo Barden. Ediouro Publicações.
Os livros indicados acima não estão mais disponíveis para a venda nas livrarias, mas ainda podem ser adquiridos na Estante Virtual.


segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O Decálogo do Enxadrista


Por Roberto Cruz.

Na obra-prima dos mestres espanhóis Antonio López Manzano e José Monedero González, O Xadrez dos Grandes Mestres: 400 conselhos para melhorar seu nível enxadrístico, um livro pródigo em ensinamentos aos jovens enxadristas, biografias e partidas comentadas de grandes mestres célebres, curiosidades, anedotas e até mesmo poesias, temos um interessante e útil decálogo para os enxadristas de todos os níveis, que transcrevo abaixo.

Nada melhor que regras de boa conduta em nosso dia a dia, principalmente em uma atividade tão competitiva como o enxadrismo, na qual os participantes muitas vezes ficam com os nervos à flor da pele.

Recomendo o excelente manual de Manzano e Monedero. Sem sombra de dúvida, um livro precioso que não pode faltar na biblioteca de qualquer enxadrista que se preze.


O Decálogo do Enxadrista

I. Preferir o xadrez a todos os demais jogos.

II. Propagar as suas virtudes.

III. Refletir sobre os lances sempre antes de executá-los.

IV. Não molestar de nenhuma forma o nosso adversário.

V. Não intervir em uma partida na qual não está jogando.

VI. Utilizar com cuidado o material do jogo: não golpear as peças, o tabuleiro ou o relógio.

VII. Não se retirar de uma competição sem um motivo justificado.

VIII. Acatar o regulamento do jogo e as decisões dos árbitros.

IX. Saber perder com humildade e dar a mão a nosso adversário após a derrota.

X. Estreitar laços de amizade entre todos os enxadristas do mundo, tal como reza o lema da FIDE: Gens una sumus (os enxadristas formam uma só família).


Leitura recomendada: 
  • O Xadrez dos Grandes Mestres, de Antonio López Manzano e José Monedero González. Editora Artmed.