Por Roberto Cruz.
O genial Machado de Assis não foi somente romancista, contista, poeta, dramaturgo, teatrólogo e jornalista, foi também um enxadrista entusiasta e compositor de problemas e enigmas de xadrez. Ele foi o autor do primeiro problema genuinamente brasileiro, originalmente publicado na revista Ilustração Brasileira no ano de 1877.
Machado, que frequentava os círculos enxadrísticos imperiais, participou do primeiro torneio de xadrez realizado no Brasil em 1880. Era amigo do músico e fortíssimo enxadrista português Arthur Napoleão e do célebre João Caldas Vianna, o criador brasileiro da defesa Rio de Janeiro para a abertura Ruy López, uma das defesas preferidas de Emanuel Lasker, um dos grandes campeões mundiais de todos os tempos. Arthur Napoleão, prodígio do piano na infância, foi um grande divulgador da música brasileira e do enxadrismo em terras tupiniquins durante décadas, além de ter sido professor de música de Chiquinha Gonzaga.
Machado mantinha correspondência com as seções especializadas dos periódicos da época e enviava cartas ao amigo Joaquim Nabuco, que estava em Londres, solicitando que lhe encaminhasse pelos correios recortes de jornais locais que continham partidas anotadas de famosos enxadristas da Europa.
Este grande mestre da literatura advogava que “das qualidades necessárias ao jogo de xadrez, duas essenciais: vista pronta e paciência beneditina, qualidades preciosas na vida que também é um xadrez, com seus problemas e partidas, umas ganhas, outras perdidas, outras nulas.” (em Iaiá Garcia, Capítulo XI).
Em 1896, ele escreveu em uma de suas crônicas: "Meu bom xadrez, meu querido xadrez, tu que és o jogo dos silenciosos, como te podes dar naquele tumulto de freqüentadores? Quero crer que ninguém te joga, nem será possível fazê-lo. Basta saber que há uma hora certa, às seis da tarde, em que sai de dentro de um tubo de ferro uma bandeira com o nome de um jogo. Como podes correr a ver o nome da bandeira, se tens de defender o teu rei – branco ou preto, – ou atacar o contrário, preto ou branco?"
Segundo Cláudio Soares, autor do brilhante artigo Machado de Assis, o enxadrista, publicado pela Academia Brasileira de Letras, a influência do pensamento enxadrístico estaria presente em toda a obra de Machado de Assis, que curiosamente chamava as peças de "trebelhos".
É importante ressaltar que Machado não foi o único célebre escritor-enxadrista da história da literatura mundial, uma vez que, ainda segundo Soares, existiram dezenas de outros e enumera, dentre eles, os mais importantes: Shakespeare, Cervantes, Goethe, Charles Dickens, Balzac, Dostoiévski, Tolstoi, Allan Poe, Conan Doyle, Orwell, Yeats, Lewis Carroll, Nabokov, Ibsen, Isaac Asimov, Baum, Kipling, Sinclair Lewis, Mailer, Melville, Puchkin, Shaw, Vonnegut, Wells, Zweig, Stevenson, Rushdie e Amis.
Leitura recomendada:
- SOARES, Cláudio S. Machado de Assis, o enxadrista. Revista Brasileira, nº 55. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2008.
- Jornal do Tocantins. Machado de Assis e suas duas paixões. Entrevista com Cláudio Soares, por Elisangela Farias, 2008.
Problema da Semana
Este é o primeiro problema de xadrez brasileiro, composto por Machado de Assis e publicado na Ilustração Brasileira em 1877. A composição foi posteriormente incluída na clássica coletânea Caissana Brasileira de Arthur Napoleão, publicada em 1898.
As brancas jogam e ganham. Mate em 2 lances.
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Solução: [ 1.Bb5! (Se 1...Rd8 2.Rf7 mate; Se 1...e5 2.Df6 mate) ]